sexta-feira, 29 de junho de 2012

Música das Sextas



Hill St. Soul é uma cantora da Zâmbia, radicada em Londres...linda que dói!...



Iyeoka é uma cantora nigeriana, radicada enos EUA.....linda que dói!!E, como disse alguém nos comentários, essa tem de ser a música do próximo filme do 007...

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Santiago do Chile



Depois eu falo sobre a cidade e tudo da viagem, mas tenho que adiantar duas coisas:

a) como o povo chileno é direto e educado!!!..sort of.... Na loja de bijuterias, havia um cartaz do qual eu não tirei a foto por que fiz o que sempre faço: não carreguei a máquina, que dizia: "Seja educado e não atenda o celular enquanto estiver sendo atendido por uma pessoa. É muita falta de educação!!". E não é que é???

b) Não conheço outro povo capaz de colocar um cartaz como este, que e mexicano, mas serve de exemplo:

E, para quem não sabia, como eu, "coco", no Chile, significa pinto, é, isso mesmo, o famoso órgão sexual masculino!!!!kakakakaka...Acho que é por isso que colocaram o coco aí!.....

OBS>: o filmezinho acima foi feito no Parque das esculturas. Peço a gentileza de notarem a cor do céu, um azul estúpido em seu atrevimento, na coragem de ferir nossos olhos!....

sábado, 23 de junho de 2012

Mike Oldfield

O filme "O Exorcista" foi uma loucura, todo mundo queria ver, sentir medo, aquela coisa de ir ao cinema para sofrer horrores. A venda de abacates, dizem, caiu a zero enquanto o filme fez sucesso. Também...não foi sem razão.
Mas eu, na época, enlouqueci com a trilha sonora de Mike Oldfield...tanta coisa junta e tudo no lugar certo. Criando climas, levando você a viajar junto com o filme, entranhando o clima das cenas em você, quase obrigando-o a participar delas...Sustos, gritos, tudo tinha o encaminhamento super-chique de Mike...
Foi lançada uma edição comemorativa do disco Tubular Bells, que era, basicamente, o score do filme. Comemorativa de quê, perguntarão os suspechosos!!Não interessa, tem muito a ser comemorado!!!.

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Teoria Queer

O texto abaixo é da Professora Guacira Lopes Louro e foi retirado do sítio www.scielo.br. Não pedi licença para reproduzi-lo aqui, caso haja problemas, post um comentário que eu retiro o texto.


Teoria queer - uma política pós-identitária para a educação

Resumo: As chamadas "minorias" sexuais são, hoje, muito mais visíveis do que antes, e, conseqüentemente, torna-se mais acirrada a luta entre elas e os grupos conservadores. Esse embate, que merece uma especial atenção de estudiosos/as culturais e educadores/as, torna-se ainda mais complexo se pensarmos que o grande desafio não consiste, apenas, em assumir que as posições de gênero e sexuais se multiplicaram e escaparam dos esquemas binários; mas também em admitir que as fronteiras vêm sendo constantemente atravessadas e que o lugar social no qual alguns sujeitos vivem é exatamente a fronteira. Uma nova dinâmica dos movimentos (e das teorias) sexuais e de gênero está em ação. É dentro desse quadro que a teoria queer precisa ser compreendida. Admitindo que uma política de identidade pode se tornar cúmplice do sistema contra o qual ela pretende se insurgir, teóricos/as queer sugerem uma teoria e uma política pós-identitárias. Inspirados no pós-estruturalismo francês, dirigem sua crítica à oposição heterossexual/homossexual, compreendida como a categoria central que organiza as práticas sociais, o conhecimento e as relações entre os sujeitos. O que, afinal, esta teoria tem a dizer para o campo da Educação?
Palavras-chave: teoria queer e educação, política de identidade e de pós-identidade, pedagogia queer


Nos dois últimos séculos, a sexualidade tornou-se objeto privilegiado do olhar de cientistas, religiosos, psiquiatras, antropólogos, educadores, passando a se constituir, efetivamente, numa 'questão'. Desde então, ela vem sendo descrita, compreendida, explicada, regulada, saneada, educada, normatizada, a partir das mais diversas perspectivas. Se, nos dias de hoje, ela continua alvo da vigilância e do controle, agora ampliaram-se e diversificaram-se suas formas de regulação, multiplicaram-se as instâncias e as instituições que se autorizam a ditar-lhe as normas, a definir-lhe os padrões de pureza, sanidade ou insanidade, a delimitar-lhe os saberes e as práticas pertinentes, adequados ou infames. Ao lado de instituições tradicionais, como o Estado, as igrejas ou a ciência, agora outras instâncias e outros grupos organizados reivindicam, sobre ela, suas verdades e sua ética. Foucault certamente diria que, contemporaneamente, proliferam cada vez mais os discursos sobre o sexo e que as sociedades continuam produzindo, avidamente, um "saber sobre o prazer" ao mesmo tempo que experimentam o "prazer de saber".(1)

Hoje, as chamadas "minorias" sexuais estão muito mais visíveis e, conseqüentemente, torna-se mais explícita e acirrada a luta entre elas e os grupos conservadores. A denominação que lhes é atribuída parece, contudo, bastante imprópria. Como afirma em seu editorial a revista La Gandhi Argentina,(2)"as minorias nunca poderiam se traduzir como uma inferioridade numérica mas sim como maiorias silenciosas que, ao se politizar, convertem o gueto em território e o estigma em orgulho ¾ gay, étnico, de gênero". Sua visibilidade tem efeitos contraditórios: por um lado, alguns setores sociais passam a demonstrar uma crescente aceitação da pluralidade sexual e, até mesmo, passam a consumir alguns de seus produtos culturais; por outro lado, setores tradicionais renovam (e recrudescem) seus ataques, realizando desde campanhas de retomada dos valores tradicionais da família até manifestações de extrema agressão e violência física.

O embate por si só merece uma especial atenção de estudiosos/as culturais e educadores/as. Mas o que o torna ainda mais complexo é sua contínua transformação e instabilidade. O grande desafio não é apenas assumir que as posições de gênero e sexuais se multiplicaram e, então, que é impossível lidar com elas apoiadas em esquemas binários; mas também admitir que as fronteiras vêm sendo constantemente atravessadas e , o que é ainda mais complicado , que o lugar social no qual alguns sujeitos vivem é exatamente a fronteira.

Escola, currículos, educadoras e educadores não conseguem se situar fora dessa história. Mostram-se, quase sempre, perplexos, desafiados por questões para as quais pareciam ter, até pouco tempo atrás, respostas seguras e estáveis. Agora as certezas escapam, os modelos mostram-se inúteis, as fórmulas são inoperantes. Mas é impossível estancar as questões. Não há como ignorar as 'novas' práticas, os 'novos' sujeitos, suas contestações ao estabelecido. A vocação normalizadora da Educação vê-se ameaçada. O anseio pelo cânone e pelas metas confiáveis é abalado. A tradição pragmática leva a perguntar: que fazer? A aparente urgência das questões não permite que se antecipe qualquer resposta; antes é preciso conhecer as condições que possibilitaram a emergência desses sujeitos e dessas práticas.

Construindo uma política de identidade

A homossexualidade e o sujeito homossexual são invenções do século XIX. Se antes as relações amorosas e sexuais entre pessoas do mesmo sexo eram consideradas como sodomia (uma atividade indesejável ou pecaminosa à qual qualquer um poderia sucumbir), tudo mudaria a partir da segunda metade daquele século: a prática passava a definir um tipo especial de sujeito que viria a ser assim marcado e reconhecido. Categorizado e nomeado como desvio da norma, seu destino só poderia ser o segredo ou a segregação , um lugar incômodo para permanecer. Ousando se expor a todas as formas de violência e rejeição social, alguns homens e mulheres contestam a sexualidade legitimada e se arriscam a viver fora de seus limites. A ciência, a Justiça, as igrejas, os grupos conservadores e os grupos emergentes irão atribuir a esses sujeitos e a suas práticas distintos sentidos. A homossexualidade, discursivamente produzida, transforma-se em questão social relevante. A disputa centra-se fundamentalmente em seu significado moral. Enquanto alguns assinalam o caráter desviante, a anormalidade ou a inferioridade do homossexual, outros proclamam sua normalidade e naturalidade , mas todos parecem estar de acordo de que se trata de um 'tipo' humano distintivo.

Esses são os discursos mais expressivos que circulam nas sociedades ocidentais, pelo menos até o início dos anos de 1970. O movimento de organização dos grupos homossexuais é, ainda, tímido; suas associações e reuniões suportam, quase sempre, a clandestinidade. Aos poucos, especialmente em países como os Estados Unidos e a Inglaterra, um aparato cultural começa a surgir: revistas, artigos isolados em jornais, panfletos, teatro, arte. No Brasil, por essa época, a homossexualidade também começa a aparecer nas artes, na publicidade e no teatro. Alguns artistas(3) apostam na ambigüidade sexual, tornando-a sua marca e, desta forma, perturbando, com suas performances, não apenas as platéias, mas toda a sociedade. A partir de 1975, emerge o Movimento de Libertação Homossexual no Brasil, do qual participam, entre outros, intelectuais exilados/as durante a ditadura militar e que traziam, de sua experiência no exterior, inquietações políticas feministas, sexuais, ecológicas e raciais que então circulavam internacionalmente.

Nos grandes centros, os termos do debate e da luta parecem se modificar. A homossexualidade deixa de ser vista (pelo menos por alguns setores) como uma condição uniforme e universal e passa ser compreendida como atravessada por dimensões de classe, etnicidade, raça, nacionalidade etc. A ação política empreendida por militantes e apoiadores torna-se mais visível e assume um caráter libertador. Suas críticas voltam-se contra a heterossexualização da sociedade. A agenda da luta também se pluraliza: para alguns o alvo é a integração social ¾ a integração numa sociedade múltipla, talvez andrógina e polimorfa; para outros (especialmente para as feministas lésbicas) o caminho é a separação ¾ a construção de uma comunidade e de uma cultura próprias. Intelectuais, espalhados em algumas instituições internacionais, mostram sua afinidade com o movimento, publicam ensaios em jornais e revistas e revelam sua estreita ligação com os grupos militantes.

Pouco a pouco constrói-se a idéia de uma comunidade homossexual. Conforme Spargo,(4) ao final dos anos 70, a política gay e lésbica abandonava o modelo que pretendia a libertação através da transformação do sistema e se encaminhava para um modelo que poderia ser chamado de 'étnico'. Gays e lésbicas eram representados como "um grupo minoritário, igual mas diferente"; um grupo que buscava alcançar igualdade de direitos no interior da ordem social existente. Afirmava-se, discursiva e praticamente, uma identidade homossexual.

A afirmação da identidade supunha demarcar suas fronteiras e implicava numa disputa quanto às formas de representá-la. Imagens homofóbicas e personagens estereotipados exibidos na mídia e nos filmes são contrapostos por representações 'positivas' de homossexuais. Reconhecer-se nessa identidade é questão pessoal e política. O dilema entre 'assumir-se' ou 'permanecer enrustido' (no armário ,closet) passa a ser considerado um divisor fundamental e um elemento indispensável para a comunidade. Na construção da identidade, a comunidade funciona como o lugar da acolhida e do suporte, uma espécie de lar. Portanto, haveria apenas uma resposta aceitável para o dilema (repetindo uma frase de Spargo, to come home, of course, you first had to 'come out'(5)): para fazer parte da comunidade homossexual, seria indispensável, antes de tudo, que o indivíduo se 'assumisse', isto é, revelasse seu 'segredo', tornando pública sua condição.

Também no Brasil, ao final dos anos 70, o movimento homossexual ganha mais força: surgem jornais ligados aos grupos organizados, promovem-se reuniões de discussão e de ativismo, as quais, segundo conta João Silvério Trevisan, se faziam ao "estilo do gay conscious raising group americano", buscando "tomar consciência de seu próprio corpo/sexualidade" e construir "uma identidade enquanto grupo social".(6)

Em conexão com o movimento político (não apenas como seu efeito mas também como sua parte integrante), cresce, internacionalmente, o número de trabalhadores/as culturais e intelectuais que se assumem na mídia, na imprensa, nas artes e nas universidades. Entre esses, alguns passam a "fazer da homossexualidade um tópico de suas pesquisas e teorizações".(7) Sem romper com a política de identidade, colocam em discussão sua concepção como um fenômeno fixo, trans-histórico e universal e voltam suas análises para as condições históricas e sociais do seu surgimento na sociedade ocidental. No Brasil (de forma mais visível a partir de 1980), a temática também passa a se constituir como questão acadêmica, na medida em que, em algumas universidades e grupos de pesquisa, vem a ser discutida, especialmente com apoio nas teorizações de Michel Foucault.

O discurso político e teórico que produz a representação 'positiva' da homossexualidade também exerce, é claro, um efeito regulador e disciplinador. Ao afirmar uma dada posição-de-sujeito, supõe, necessariamente, o estabelecimento de seus contornos, seus limites, suas possibilidades e restrições. Nesse discurso, é a escolha do objeto amoroso que define a identidade sexual e, sendo assim, a identidade gay ou lésbica assenta-se na preferência em manter relações sexuais com alguém do mesmo sexo. Contudo, essa definição de identidade sexual, aparentemente indiscutível, poderia ser posta em questão:

Como a História da Sexualidade de Foucault havia mostrado, tal escolha do objeto nem sempre tinha se constituído a base para uma identidade e, como muitas vozes discordantes sugeriam, esse não era, inevitavelmente, o fator crucial na percepção de toda e qualquer pessoa sobre sua sexualidade. Este modelo fazia, efetivamente, com que os bissexuais parecessem ter uma identidade menos segura ou menos desenvolvida (assim como os modelos essencialistas de gênero fazem dos trans-sexuais sujeitos incompletos), e excluía grupos que definiam sua sexualidade através de atividades e prazeres mais do que através das preferências de gênero, tais como os/as sadomasoquistas.(8)

Com esses contornos, a política de identidade praticada durante os anos 70 assumia um caráter unificador e assimilacionista, buscando a aceitação e a integração dos/das homossexuais no sistema social. A maior visibilidade de gays e lésbicas sugeria que o movimento já não perturbava o status quo como antes. No entanto, tensões e críticas internas já se faziam sentir. Para muitos (especialmente para os grupos negros, latinos e jovens), as campanhas políticas estavam marcadas pelos valores brancos e de classe média e adotavam, sem questionar, ideais convencionais, como o relacionamento comprometido e monogâmico; para algumas lésbicas, o movimento repetia o privilegiamento masculino evidente na sociedade mais ampla, o que fazia com que suas reivindicações e experiências continuassem secundárias face às dos homens gays; para bissexuais, sadomasoquistas e trans-sexuais essa política de identidade era excludente e mantinha sua condição marginalizada. Mais do que diferentes prioridades políticas defendidas pelos vários 'sub-grupos', o que estava sendo posto em xeque, nesses debates, era a concepção da identidade homossexual unificada que vinha se constituindo na base de tal política de identidade. A comunidade apresentava importantes fraturas internas e seria cada vez mais difícil silenciar as vozes discordantes.

No início dos anos 80, o surgimento da Aids agregaria novos elementos a este quadro. Apresentada, inicialmente, como o 'câncer gay', a doença teve o efeito imediato de renovar a homofobia latente da sociedade, intensificando a discriminação já demonstrada por certos setores sociais. A intolerância, o desprezo e a exclusão, aparentemente abrandados pela ação da militância homossexual, mostravam-se mais uma vez intensos e exacerbados. Simultaneamente, a doença também teve um impacto que alguns denominaram de 'positivo', na medida em que provocou o surgimento de redes de solidariedade. O resultado são alianças não necessariamente baseadas na identidade, mas sim num sentimento de afinidade que une tanto os sujeitos atingidos (muitos, certamente, não-homossexuais) quanto seus familiares, amigos, trabalhadores e trabalhadoras da área da saúde, etc. As redes escapam, portanto, dos contornos da comunidade homossexual tal como era definida até então. O combate à doença também acarreta um deslocamento nos discursos a respeito da sexualidade, agora os discursos se dirigem menos às identidades e se concentram mais nas práticas sexuais (ao enfatizar, por exemplo, a prática do sexo seguro).

Especificamente em relação à sociedade brasileira, João Silvério Trevisan comenta que, devido à Aids, foi ampliada a discussão a respeito da homossexualidade. Diante da expansão da doença e de sua associação com a homossexualidade, "a metáfora, tantas vezes empregada nas entrelinhas ¾ de que a homossexualidade pega quase deixou de ser metáfora".(9) A homofobia mostrava-se com toda sua crueza. A partir desse momento, segundo ele, além de se tornar mais evidente o desejo homossexual, ocorreu uma espécie de "efeito colateral da epidemia sexualizada": a deflagração de uma "epidemia de informação".(10)

Para ele, o vírus da Aids realizou em alguns anos uma proeza que nem o mais bem-intencionado movimento pelos direitos homossexuais teria conseguido, em muitas décadas: deixar evidente à sociedade que homossexual existe e não é o outro, no sentido de um continente à parte, mas está muito próximo de qualquer cidadão comum, talvez ao meu lado e , isto é importante!, dentro de cada um de nós, pelo menos enquanto virtualidade.(11)

Já se haviam ampliado, então, consideravelmente, os grupos ativistas no Brasil, não apenas de gays mas também de lésbicas. Pelas características políticas que o país vivia, o movimento homossexual brasileiro via-se dividido entre a possibilidade de se integrar aos partidos políticos ou de continuar sua luta de forma independente, e isso se constituía em mais uma de suas tensões internas.

Em termos globais, multiplicam-se os movimentos e os seus propósitos: alguns grupos homossexuais permanecem lutando por reconhecimento e por legitimação, buscando sua inclusão, em termos igualitários, ao conjunto da sociedade; outros estão preocupados em desafiar as fronteiras tradicionais de gênero e sexuais, pondo em xeque as dicotomias masculino/feminino, homem/mulher, heterossexual/homossexual; e ainda outros não se contentam em atravessar as divisões mas decidem viver a ambigüidade da própria fronteira. A nova dinâmica dos movimentos sexuais e de gênero provoca mudanças nas teorias e, ao mesmo tempo, é alimentada por elas.

A agenda teórica moveu-se da análise das desigualdades e das relações de poder entre categorias sociais relativamente dadas ou fixas (homens e mulheres, gays e heterossexuais) para o questionamento das próprias categorias, sua fixidez, separação ou limites, e para ver o jogo do poder ao redor delas como menos binário e menos unidirecional.(12)

A política de identidade homossexual estava em crise e revelava suas fraturas e insuficiências. Gradativamente, surgiriam, pois, proposições e formulações teóricas pós-identitárias. É precisamente dentro desse quadro que a afirmação de uma política e de uma teoria queer precisa ser compreendida.


Uma teoria e uma política pós-identitária

Queer pode ser traduzido por estranho, talvez ridículo, excêntrico, raro, extraordinário. Mas a expressão também se constitui na forma pejorativa com que são designados homens e mulheres homossexuais. Um insulto que tem, para usar o argumento de Judith Butler,(13) a força de uma invocação sempre repetida, um insulto que ecoa e reitera os gritos de muitos grupos homófobos, ao longo do tempo, e que, por isso, adquire força, conferindo um lugar discriminado e abjeto àqueles a quem é dirigido. Este termo, com toda sua carga de estranheza e de deboche, é assumido por uma vertente dos movimentos homossexuais precisamente para caracterizar sua perspectiva de oposição e de contestação. Para esse grupo, queer significa colocar-se contra a normalização, venha ela de onde vier. Seu alvo mais imediato de oposição é, certamente, a heteronormatividade compulsória da sociedade; mas não escaparia de sua crítica a normalização e a estabilidade propostas pela política de identidade do movimento homossexual dominante. Queer representa claramente a diferença que não quer ser assimilada ou tolerada e, portanto, sua forma de ação é muito mais transgressiva e perturbadora.(14)

A política queer está estreitamente articulada à produção de um grupo de intelectuais que, ao redor dos anos 90, passa a utilizar este termo para descrever seu trabalho e sua perspectiva teórica. Ainda que esse seja um grupo internamente bastante diversificado, capaz de expressar divergências e de manter debates acalorados, há entre seus integrantes algumas aproximações significativas. Diz Seidman:

Os/as teóricos/as queer constituem um agrupamento diverso que mostra importantes desacordos e divergências. Não obstante, eles/elas compartilham alguns compromissos amplos ¾ em particular, apóiam-se fortemente na teoria pós-estruturalista francesa e na desconstrução como um método de crítica literária e social; põem em ação, de forma decisiva, categorias e perspectivas psicanalíticas; são favoráveis a uma estratégia descentradora ou desconstrutiva que escapa das proposições sociais e políticas programáticas positivas; imaginam o social como um texto a ser interpretado e criticado com o propósito de contestar os conhecimentos e as hierarquias sociais dominantes.(15)

As condições que possibilitam a emergência do movimento queer ultrapassam, pois, questões pontuais da política e da teorização gay e lésbica e precisam ser compreendidas dentro do quadro mais amplo do pós-estruturalismo. Efetivamente, a teoria queer pode ser vinculada às vertentes do pensamento ocidental contemporâneo que, ao longo do século XX, problematizaram noções clássicas de sujeito, de identidade, de agência, de identificação.

Já no início do século, o sujeito racional, coerente e unificado é abalado por Freud com suas formulações sobre o inconsciente e a vida psíquica. A existência de desejos e idéias ignorados pelo próprio indivíduo e sobre os quais ele não tem controle é devastadoras para o pensamento racional vigente: ao ignorar seus desejos mais profundos, ao se mostrar incapaz de controlar suas lembranças, o sujeito se 'desconhece' e, portanto, deixa de ser 'senhor de si'. Mais tarde, Lacan perturba qualquer certeza sobre o processo de identificação e de agência, ao afirmar que o sujeito nasce e cresce sob o olhar do outro, que ele só pode saber de si através do outro, ou melhor, que ele sempre se percebe e se constitui nos termos do outro. Longe de ser estável e coeso, esse é um sujeito dividido, que vive, constantemente, a inútil busca da completude. As possibilidades de autodeterminação e de agência também são postas em xeque pela teorização de Althusser quando este demonstra como os sujeitos são interpelados e capturados pela ideologia. Conforme Althusser, ao se entregar à ideologia, o sujeito realiza, de forma aparentemente livre, seu próprio processo de sujeição.

Ao lado dessas teorizações que problematizaram de forma radical a racionalidade moderna, destacam-se os insights de Michel Foucault sobre a sexualidade, diretamente relevantes para a formulação da teoria queer. Conforme Foucault, vivemos, já há mais de um século, numa sociedade que "fala prolixamente de seu próprio silêncio, obstina-se em detalhar o que não diz, denuncia os poderes que exerce e promete liberar-se das leis que a fazem funcionar".(16) Ele desconfia desse alegado silêncio e, contrariando tal hipótese, afirma que o sexo foi, na verdade, "colocado em discurso": temos vivido mergulhados em múltiplos discursos sobre a sexualidade, pronunciados pela igreja, pela psiquiatria, pela sexologia, pelo direito... Empenha-se em descrever esses discursos e seus efeitos, analisando não apenas como, através deles, se produziram e se multiplicaram as classificações sobre as 'espécies' ou 'tipos' de sexualidade, mas também como se ampliaram os modos de controlá-la. Tal processo tornou possível, segundo ele, a formação de um "discurso reverso", isto é, um discurso produzido a partir do lugar que tinha sido apontado como a sede da perversidade, como o lugar do desvio e da patologia: a homossexualidade. Mas Foucault ultrapassa amplamente o esquema binário de oposição entre dois tipos de discursos, acentuando que vivemos uma proliferação e uma dispersão de discursos, bem como uma dispersão de sexualidades. Diz ele:

assistimos a uma explosão visível das sexualidades heréticas, mas sobretudo - e é esse o ponto importante - a um dispositivo bem diferente da lei: mesmo que se apóie localmente em procedimentos de interdição, ele assegura, através de uma rede de mecanismos entrecruzados, a proliferação de prazeres específicos e a multiplicação de sexualidades disparatadas.(17)

A construção discursiva das sexualidades, exposta por Foucault, vai se mostrar fundamental para a teoria queer. Da mesma forma, a operação de desconstrução, proposta por Jacques Derrida, parecerá, para muitos teóricos e teóricas, o procedimento metodológico mais produtivo. Conforme Derrida, a lógica ocidental opera, tradicionalmente, através de binarismos: este é um pensamento que elege e fixa como fundante ou como central uma idéia, uma entidade ou um sujeito, determinando, a partir desse lugar, a posição do 'outro', o seu oposto subordinado. O termo inicial é compreendido sempre como superior, enquanto que o outro é o seu derivado, inferior. Derrida afirma que essa lógica poderia ser abalada através de um processo desconstrutivo que estrategicamente revertesse, desestabilizasse e desordenasse esses pares. Desconstruir um discurso implicaria em minar, escavar, perturbar e subverter os termos que afirma e sobre os quais o próprio discurso se afirma. Desconstruir não significa destruir, como lembra Barbara Johnson ,(18) mas "está muito mais perto do significado original da palavra análise, que, etimologicamente, significa desfazer". Portanto, ao se eleger a desconstrução como procedimento metodológico, está se indicando um modo de questionar ou de analisar e está se apostando que esse modo de análise pode ser útil para desestabilizar binarismos lingüísticos e conceituais (ainda que se trate de binarismos tão seguros como homem/mulher, masculinidade/feminilidade). A desconstrução das oposições binárias tornaria manifesta a interdependência e a fragmentação de cada um dos pólos. Trabalhando para mostrar que cada pólo contém o outro, de forma desviada ou negada, a desconstrução indica que cada pólo carrega vestígios do outro e depende desse outro para adquirir sentido. A operação sugere também o quanto cada pólo é, em si mesmo, fragmentado e plural. Para os teóricos/as queer, a oposição heterossexualidade/homossexualidade - onipresente na cultura ocidental moderna - poderia ser efetivamente criticada e abalada por meio de procedimentos desconstrutivos.

Na medida em que queer sinaliza para o estranho, para a contestação, para o que está fora-do-centro, seria incoerente supor que a teoria se reduzisse a uma 'aplicação' ou a uma extensão de idéias fundadoras. Os teóricos e teóricas queer fazem um uso próprio e transgressivo das proposições das quais se utilizam, geralmente para desarranjar e subverter noções e expectativas. É o caso de Judith Butler, uma das mais destacadas teóricas queer. Ao mesmo tempo em que reafirma o caráter discursivo da sexualidade, ela produz novas concepções a respeito de sexo, sexualidade, gênero. Butler afirma que as sociedades constroem normas que regulam e materializam o sexo dos sujeitos e que essas "normas regulatórias" precisam ser constantemente repetidas e reiteradas para que tal materialização se concretize. Contudo, ela acentua que "os corpos não se conformam, nunca, completamente, às normas pelas quais sua materialização é imposta",(19) daí que essas normas precisam ser constantemente citadas, reconhecidas em sua autoridade, para que possam exercer seus efeitos. As normas regulatórias do sexo têm, portanto, um caráter performativo, isto é, têm um poder continuado e repetido de produzir aquilo que nomeiam e, sendo assim, elas repetem e reiteram, constantemente, as normas dos gêneros na ótica heterossexual.

Judith Butler toma emprestado da lingüística o conceito de performatividade, para afirmar que a linguagem que se refere aos corpos ou ao sexo não faz apenas uma constatação ou uma descrição desses corpos, mas, no instante mesmo da nomeação, constrói, 'faz' aquilo que nomeia, isto é, produz os corpos e os sujeitos. Esse é um processo constrangido e limitado desde seu início, pois o sujeito não decide sobre o sexo que irá ou não assumir; na verdade, as normas regulatórias de uma sociedade abrem possibilidades que ele assume, apropria e materializa. Ainda que essas normas reiterem sempre, de forma compulsória, a heterossexualidade, paradoxalmente, elas também dão espaço para a produção dos corpos que a elas não se ajustam. Esses serão constituídos como sujeitos "abjetos" ¾ aqueles que escapam da norma. Mas, precisamente por isso, esses sujeitos são socialmente indispensáveis, já que fornecem o limite e a fronteira, isto é, fornecem "o exterior" para os corpos que "materializam a norma", os corpos que efetivamente "importam".(20)

Butler, como outros teóricos queer, volta sua crítica e sua argumentação para a oposição binária heterossexual/homossexual. Esses teóricos e teóricas afirmam que a oposição preside não apenas os discursos homofóbicos, mas continua presente, também, nos discursos favoráveis à homossexualidade. Seja para defender a integração dos/as homossexuais ou para reivindicar uma espécie ou uma comunidade em separado; seja para considerar a sexualidade como originariamente 'natural' ou para considerá-la como socialmente construída, esses discursos não escapam da referência à heterossexualidade como norma. Conforme Seidman, "permanece intocado o binarismo heterossexual/homossexual como a referência mestra para a construção do eu, do conhecimento sexual e das instituições sociais".(21) Esse posicionamento parece insuficiente, uma vez que não abala, de fato, o regime vigente. Segundo os teóricos e teóricas queer é necessário empreender uma mudança epistemológica que efetivamente rompa com a lógica binária e com seus efeitos: a hierarquia, a classificação, a dominação e a exclusão. Uma abordagem desconstrutiva permitiria compreender a heterossexualidade e a homossexualidade como interdependentes, como mutuamente necessárias e como integrantes de um mesmo quadro de referências. A afirmação da identidade implica sempre a demarcação e a negação do seu oposto, que é constituído como sua diferença. Esse 'outro' permanece, contudo, indispensável. A identidade negada é constitutiva do sujeito, fornece-lhe o limite e a coerência e, ao mesmo tempo, assombra-o com a instabilidade. Numa ótica desconstrutiva, seria demonstrada a mútua implicação/constituição dos opostos e se passaria a questionar os processos pelos quais uma forma de sexualidade (a heterossexualidade) acabou por se tornar a norma, ou, mais do que isso, passou a ser concebida como 'natural'.

Ao alertar para o fato de que uma política de identidade pode se tornar cúmplice do sistema contra o qual ela pretende se insurgir, os teóricos e as teóricas queer sugerem uma teoria e uma política pós-identitárias. O alvo dessa política e dessa teoria não seriam propriamente as vidas ou os destinos de homens e mulheres homossexuais, mas sim a crítica à oposição heterossexual/homossexual, compreendida como a categoria central que organiza as práticas sociais, o conhecimento e as relações entre os sujeitos. Trata-se, portanto, de uma mudança no foco e nas estratégias de análise; trata-se de uma outra perspectiva epistemológica que está voltada, como diz Seidman, para a cultura, para as "estruturas lingüísticas ou discursivas" e para seus "contextos institucionais":

A teoria queer constitui-se menos numa questão de explicar a repressão ou a expressão de uma minoria homossexual do que numa análise da figura hetero/homossexual como um regime de poder/saber que molda a ordenação dos desejos, dos comportamentos e das instituições sociais, das relações sociais - numa palavra, a constituição do self e da sociedade.(22)

Uma pedagogia e um currículo queer

Como um movimento que se remete ao estranho e ao excêntrico pode se articular com a Educação, tradicionalmente o espaço da normalização e do ajustamento? Como uma teoria não-propositiva pode 'falar' a um campo que vive de projetos e de programas, de intenções, objetivos e planos de ação? Qual o espaço, nesse campo usualmente voltado ao disciplinamento e à regra, para a transgressão e para a contestação? Como romper com binarismos e pensar a sexualidade, os gêneros e os corpos de uma forma plural, múltipla e cambiante? Como traduzir a teoria queer para a prática pedagógica?

Para ensaiar respostas a tais questões é preciso ter em mente não apenas o alvo mais imediato e direto da teoria queer: o regime de poder-saber que, assentado na oposição heterossexualidade/homossexualidade, dá sentido às sociedades contemporâneas, mas também considerar as estratégias, os procedimentos e as atitudes nela implicados. A teoria queer permite pensar a ambigüidade, a multiplicidade e a fluidez das identidades sexuais e de gênero mas, além disso, também sugere novas formas de pensar a cultura, o conhecimento, o poder e a educação.

Tomaz Tadeu da Silva argumenta que,tal como o feminismo, a teoria queer efetua uma verdadeira reviravolta epistemológica. A teoria queer quer nos fazer pensar queer (homossexual, mas também "diferente") e não straight (heterossexual, mas também "quadrado"): ela nos obriga a considerar o impensável, o que é proibido pensar, em vez de simplesmente considerar o pensável, o que é permitido pensar. (...) O queer se torna, assim, uma atitude epistemológica que não se restringe à identidade e ao conhecimento sexuais, mas que se estende para o conhecimento e a identidade de modo geral. Pensar queer significa questionar, problematizar, contestar, todas as formas bem-comportadas de conhecimento e de identidade. A epistemologia queer é, neste sentido, perversa, subversiva, impertinente, irreverente, profana, desrespeitosa.(23)

Uma pedagogia e um currículo queer se distinguiriam de programas multiculturais bem intencionados, onde as diferenças (de gênero, sexuais ou étnicas) são toleradas ou são apreciadas como curiosidades exóticas. Uma pedagogia e um currículo queer estariam voltados para o processo de produção das diferenças e trabalhariam, centralmente, com a instabilidade e a precariedade de todas as identidades. Ao colocar em discussão as formas como o 'outro' é constituído, levariam a questionar as estreitas relações do eu com o outro. A diferença deixaria de estar lá fora, do outro lado, alheia ao sujeito, e seria compreendida como indispensável para a existência do próprio sujeito: ela estaria dentro, integrando e constituindo o eu. A diferença deixaria de estar ausente para estar presente: fazendo sentido, assombrando e desestabilizando o sujeito. Ao se dirigir para os processos que produzem as diferenças, o currículo passaria a exigir que se prestasse atenção ao jogo político aí implicado: em vez de meramente contemplar uma sociedade plural, seria imprescindível dar-se conta das disputas, dos conflitos e das negociações constitutivos das posições que os sujeitos ocupam.

Dentro desse quadro, a polarização heterossexual/homossexual seria questionada. Analisada a mútua dependência dos pólos, estariam colocadas em xeque a naturalização e a superioridade da heterossexualidade. O combate à homofobia, uma meta ainda importante, precisaria avançar. Para uma pedagogia e um currículo queer não seria suficiente denunciar a negação e o submetimento dos/as homossexuais, e sim desconstruir o processo pelo qual alguns sujeitos se tornam normalizados e outros marginalizados. Tornar evidente a heteronormatividade, demonstrando o quanto é necessária a constante reiteração das normas sociais regulatórias a fim de garantir a identidade sexual legitimada. Analisar as estratégias, públicas e privadas, dramáticas ou discretas, que são mobilizadas, coletiva e individualmente, para vencer o medo e a atração das identidades desviantes e para recuperar uma suposta estabilidade no interior da identidade-padrão.

Problematizar, também, as estratégias normalizadoras que, no quadro de outras identidades sexuais (e também no contexto de outros grupos identitários, como os de raça, nacionalidade ou classe),(24) pretendem ditar e restringir as formas de viver e de ser. Pôr em questão as classificações e os enquadramentos. Apreciar a transgressão e o atravessamento das fronteiras (de toda ordem), explorar a ambigüidade e a fluidez. Reinventar e reconstruir, como prática pedagógica, estratégias e procedimentos acionados pelos ativistas queer, como, por exemplo, a estratégia de "mostrar o queer naquilo que é pensado como normal e o normal no queer".(25)

Transferir a outras polaridades esse mecanismo desconstrutivo, perturbando até mesmo o mais caro binarismo do campo educacional, aquele que opõe o conhecimento à ignorância. Seguindo o pensamento de Eve Sedgwick, demonstrar, como sugerem teóricas/os queer, que a ignorância não é "neutra", nem é um "estado original", mas, em vez disso, que ela "é um efeito, não uma ausência, de conhecimento".(26)Admitir que a ignorância pode ser compreendida como sendo produzida por um tipo particular de conhecimento ou produzida por um modo de conhecer. Assim, a ignorância da homossexualidade poderia ser lida como sendo constitutiva de um modo particular de conhecer a sexualidade. Deborah Britzman afirma:

O velho dualismo binário da ignorância e do conhecimento não pode lidar com o fato de que qualquer conhecimento já contém suas próprias ignorâncias. Se, por exemplo, os/as jovens e os/as educadores/as são ignorantes sobre a homossexualidade, é quase certo que eles/elas também sabem pouco sobre a heterossexualidade. O que, pois, é exigido do conhecedor para que compreenda a ignorância não como um acidente do destino, mas como um resíduo do conhecimento? Em outras palavras, que ocorrerá se lermos a ignorância sobre a homossexualidade não apenas como efeito de não se conhecer os homossexuais ou como um outro caso de homofobia, mas como ignorância sobre a forma como a sexualidade é moldada?(27) (destaques meus).

A "reviravolta epistemológica" provocada pela teoria queer transborda, pois, o terreno da sexualidade. Ela provoca e perturba as formas convencionais de pensar e de conhecer. A sexualidade, polimorfa e perversa, é ligada à curiosidade e ao conhecimento. O erotismo pode ser traduzido no prazer e na energia dirigidos a múltiplas dimensões da existência. Uma pedagogia e um currículo conectados à teoria queer teriam de ser, portanto, tal como ela, subversivos e provocadores. Teriam de fazer mais do que incluir temas ou conteúdos queer; ou mais do que se preocupar em construir um ensino para sujeitos queer. Como afirma William Pinar,(28) "uma pedagogia queer desloca e descentra; um currículo queer é não-canônico". As classificações são improváveis. Tal pedagogia não pode ser reconhecida como uma pedagogia do oprimido, como libertadora ou libertária. Ela escapa de enquadramentos. Evita operar com os dualismos, que acabam por manter a lógica da subordinação. Contrapõe-se, seguramente, à segregação e ao segredo experimentados pelos sujeitos 'diferentes', mas não propõe atividades para seu fortalecimento nem prescreve ações corretivas para aqueles que os hostilizam. Antes de pretender ter a resposta apaziguadora ou a solução que encerra os conflitos, quer discutir (e desmantelar) a lógica que construiu esse regime, a lógica que justifica a dissimulação, que mantém e fixa as posições de legitimidade e ilegitimidade. "Em vez de colocar o conhecimento (certo) como resposta ou solução, a teoria e a pedagogia queer (...) colocam o conhecimento como uma questão interminável".(29)

Vistos sob essa perspectiva, uma pedagogia e um currículo queer 'falam' a todos e não se dirigem apenas àqueles ou àquelas que se reconhecem nessa posição-de-sujeito, isto é, como sujeitos queer. Uma tal pedagogia sugere o questionamento, a desnaturalização e a incerteza como estratégias férteis e criativas para pensar qualquer dimensão da existência. A dúvida deixa de ser desconfortável e nociva para se tornar estimulante e produtiva. As questões insolúveis não cessam as discussões, mas, em vez disso, sugerem a busca de outras perspectivas, incitam a formulação de outras perguntas, provocam o posicionamento a partir de outro lugar. Certamente, essas estratégias também acabam por contribuir na produção de um determinado 'tipo' de sujeito. Mas, neste caso, longe de pretender atingir, finalmente, um modelo ideal, esse sujeito, e essa pedagogia, assumem seu caráter intencionalmente inconcluso e incompleto.

Efetivamente, os contornos de uma pedagogia ou de um currículo queer não são os usuais: faltam-lhes as proposições e os objetivos definidos, as indicações precisas do modo de agir, as sugestões sobre as formas adequadas para 'conduzir' os/as estudantes, a determinação do que 'transmitir'. A teoria que lhes serve de referência é desconcertante e provocativa. Tal como os sujeitos de que fala, a teoria queer é, ao mesmo tempo, perturbadora, estranha e fascinante. Por tudo isso, ela parece arriscada. E talvez seja mesmo... mas, seguramente, ela também faz pensar.



Referências bibliográficas

BRITZMAN, Deborah. "O que é esta coisa chamada amor, identidade homossexual, educação e currículo". Educação e Realidade, v. 21 (1), p. 71-96, jan./jun. 1996.

BUTLER, Judith. "Corpos que pesam: sobre os limites discursivos do 'sexo'". In: LOURO, Guacira Lopes (Org.). O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 1999. p. 151-172.

DERRIDA, Jacques. Margens da filosofia. Porto: Rés-Editora.

EPSTEIN, Debbie; JOHNSON, Richard. Schooling Sexualities. Buckinghan: Open University Press, 1998.

FOUCAULT, Michel. A história da sexualidade 1: a vontade de saber. 11. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1993.

JAGOSE, Annamarie. Queer Theory. An introduction. Nova York: New York University Press, 1996.

JOHSON, Barbara. Excerto de The Critical Difference (1981), recolhido em maio 2001, do site: http://prelectur.stanford.edu/lecturers/derrida/deconstruction.html.

La Gandhi Argentina. Editorial. Ano 2 (3), nov. 1998.

LUHMANN, Suzanne. "Queering/Querying Pedagogy? Or, Pedagogy is a pretty queer thing". In: PINAR, William F. (Org.). Queer Theory in Education. New Jersey e Londres: Lawrence Erlbaum Associates, Publishers, 1998. p. 141-156.

PINAR, William. "Introduction". In: PINAR, William (Org.). Queer Theory in Education. New Jersey e Londres: Lawrence Erlabaum Associates Publishers, 1998. p. 1-47.

SEIDMAN, Steven. "Deconstructing Queer Theory or the Under-Theorization of the Social and the Ethical". In: NICHOLSON, Linda; SEIDMAN, Steven. (Orgs.). Social Postmodernism. Beyond identity politics. Cambridge: Cambridge University Press, 1995. p. 116-141.

SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.

SPARGO, Tamsin. Foucault and Queer Theory. Nova York: Totem Books, 1999.

TIERNEY, William; DILLEY, Patrick. "Constructing Knowledge: Educational Research and Gay and Lesbian Studies". In: PINAR, William (Org.). Queer Theory in Education. New Jersey e Londres: Lawrence Erlabaum Associates Publishers, 1998. p. 49-71.

TREVISAN, João Silvério. Devassos no paraíso: a homossexualidade no Brasil, da colônia à atualidade. 3. ed. Rio de Janeiro e São Paulo: Editora Record, 2000.


1 FOUCAULT, 1993.
2 La Gandhi Argentina, 1998.
3 Nos anos 70, o cantor Ney Matogrosso e o grupo Dzi Croquetes embaralham propositalmente as referências femininas e masculinas em suas performances e, segundo José Silvério Trevisan, acabam por desempenhar um papel importante e provocador no debate sobre política sexual no Brasil. Trevisan (2000, p. 288) afirma que os Dzi Croquetes "trouxeram para o Brasil o que de mais contemporâneo e questionador havia no movimento homossexual internacional, sobretudo americano".
4 SPARGO, 1999, p. 29.
5SPARGO, 1999, p. 30.
6 TREVISAN, 2000, p. 339.
7SEIDMAN, 1995, p. 121.
8 SPARGO, 1999, p. 34.
9 TREVISAN, 2000, p. 462.
10 TREVISAN, 2000, p. 463. De fato, a partir da segunda metade dos anos 80, no Brasil, passou-se a discutir muito mais a sexualidade (e a homossexualidade) em várias instâncias sociais, inclusive nas escolas. A preocupação em engajar-se no combate à doença fez com que organismos oficiais, tais como o Ministério de Educação e Cultura, passassem a estimular projetos de educação sexual e, em 1996, o MEC incluiu a temática, como tema transversal, nos seus Parâmetros Curriculares Nacionais (os PCNs, a nova diretriz para educação do País). Vale notar, contudo, que as condições que possibilitaram a ampliação da discussão sobre a sexualidade também tiveram o efeito de aproximá-la das idéias de risco e de ameaça, colocando em segundo plano sua associação ao prazer e à vida.
11 TREVISAN, 2000, p. 462.
12 EPSTEIN e JOHNSON, 1998, p. 37-38.
13 BUTLER, 1999.
14 Algumas vezes queer é utilizado como um termo síntese para se referir, de forma conjunta, a gays e lésbicas. Esse uso é, no entanto, pouco sugestivo das implicações políticas envolvidas na eleição do termo, feita por parte do movimento homossexual, exatamente para marcar (e distinguir) sua posição não-assimilacionista e não-normativa. Deve ser registrado, ainda, que a preferência por queer também representa, pelo menos na ótica de alguns, uma rejeição ao caráter médico que estaria implícito na expressão "homossexual.
15 SEIDMAN, 1995, p. 125.
16 FOUCAULT, 1993, p. 14.
17 FOUCAULT, 1993, p. 48.
18 JOHNSON, 1981.
19 BUTLER, 1999, p. 154.
20 BUTLER, 1999.
21 SEIDMAN, 1995 , p. 126.
22 SEIDMAN, 1995 , p. 128.
23 SILVA, 2000, p. 107.
24 Eve Sedgwick afirma que "queer tem se estendido ao longo de dimensões que não podem ser subsumidas, inteiramente, ao gênero e à sexualidade: por exemplo, aos modos pelos quais raça, etnicidade, nacionalidade pós-colonial entrecruzam-se com esses e com outros discursos de constituição-de-identidade, de fratura-de-identidade" (Sedgwick apud Jagose, 1996, p. 99).
25 TIERNEY e DILLEY, 1998 , p. 60.
26 BRITZMAN, 1996, p. 91.
27 BRITZMAN, 1996, P. 91.
28 PINAR, 1998, p. 3.
29 LUHMANN, 2000, p. 151.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Zé Renato

Desde o Boca Livre, ele se destacava. Gravou aquela maravilha, o CD Arranha Céu, somente com gravações feitas pelo Silvio Caldas (este, eu acho que desta vez morreu mesmo!! Não volta!!). Gravou outro CD maravilhoso com um grupo português, cujo nome me foge agora, mas vale muito a pena. Depois, quando eu lembrar ou encontrar, coloco como comentário.
Gostei muito desta música, pela singeleza...eu também quero, queria  por que achei...

terça-feira, 19 de junho de 2012

Cavafy

Ele escreveu pouquíssimo, mas também nem precisa escrever muito mais.
Acho que há uma tradução do José Paulo, mas eu não consigo achar o livro. Já foi relançado várias vezes, mas o livro se esgota rapidamente, um sinal de que há mercado para sua poesia. E são apenas 154 poemas escritos em toda a sua (dele) vida, os quais foram burilados incansavelmente pelo autor.


In Despair
He lost him completely. And he now tries to find
his lips in the lips of each new lover,
he tries in the unior with each new lover
to convince himself that it´s the same young man,
that it's to him he gives himself.
He lost him completely, as though he never existed.
He wanted, his lover said, to save himself
from the tainted, unhealthy form of sexual pleasure,
the tainted, shameful form of sexual pleasure.
There was still time, he said, to save himself.
He lost him completely, as though he never existed.
Through fantasy, through hallucination,
he tries to find his lips in the lips of the other young men,
he longs to feel his kind of love once more.

sábado, 16 de junho de 2012

Boi da Paciência

.........................Boi da Paciência ......................

Noite dos limites e das esquinas nos ombros
noite por demais aguentada com filosofia a mais
que faz o boi da paciência aqui?
que fazemos nós aqui?
este espetáculo que não vem anunciado
todos os dias cumprido com as leis do diabo
todos os dias metido pelos olhos adentro
numa evidência que nos cega
até quando?
Era tempo de começar a fazer qualquer coisa
os meus nervos estão presos na encruzilhada
e o meu corpo não é mais que uma cela ambulante
e a minha vida não é mais que um teorema
por demais sabido!

Na pobreza do meu caderno
como inscrever este ceu que suspeito
como amortecer um pouco a vertigem desta órbita
e todos o entusiasmo destas mãos de universo
cuja carícia é um deslizar de estrelas?
Há uma casa que me espera
para uma festa de irmãos
há toda esta noite a negar que me esperam
e estes rostos de insônia
e o martelar opaco num juro de papel
e o arranhar persistente duma pena implacável
e a surpresa subornada pela rotina
e o muro destrutível destruindo as nossas vidas
e o marcar passo à frente deste muro
e a força que fazemos no silêncio para derrubar o muro
até quando?até quando?

Teoricamente livre para navegar entre estrelas
minha vida tem limites assassinos
Supliquei a meus companheiros: Mas fuzilem-me!
Inventei um deus só para que me matasse
Muralhei-me de amor
e o amor desabrigou-me
Escrevi cartas a minha mãe desesperadas
colori mitos e distribuí-me em segredo
e ao fim e ao cabo
recomeçar
Mas estou cansado de recomeçar!
Quereria gritar: Dêem-me árvores para um novo recomeço!
Aproximem-me a natureza até que a cheire!
Desertem-me este quarto onde me perco!
Deixem-me livre por um momento em qualquer parte
para uma meditação mais natural e fecunda
que me limpe o sangue!
Recomeçar!
Mas originalmente com uma nova respiração
que me limpe o sangue deste polvo de detritos
que eu sinta os pulmões como duas velas pandas
e que eu diga em nome dos mortos e dos vivos
em nome do sofrimento e da felicidade
em nome dos animais e dos utensílios criadores
em nome de todas as vidas sacrificadas
em nome dos sonhos
em nome das colheitas em nome das raízes
em nome dos países em nome das crianças
em nome da paz
que a vida vale a pena que ela é a nossa medida
que a vida é uma vitória que se constrói todos os dias
que o reino da bondade dos olhos dos poetas
vai começar na terra sobre o horror e a miséria
que o nosso coração se deve engrandecer
por ser tamanho de todas a s esperanças
e tão claro como os olhos das crianças
e tão pequenino que uma delas possa brincar com ele

Mas o homenzinho diário recomeça
no seu giro de desencontros
A fadiga substituiu-lhe o coração
As cores da inércia giram-lhe nos olhos
Um quarto de aluguel
como preservar este amor
ostentando-o na sombra?
Somos colegas forçados
Os mais simples são os melhores
nos seus limites conservam a humanidade
Mas este sedento lúcido e implacável
familiar do absurdo que o envolve
com uma vida de relógio a funcionar
e um mapa da terra com rios verdadeiros
correndo-lhe na cabeça
como poderá suportar viver na contenção total
na recusa permanente a este absurdo vivo?

Ó boi da paciência, que fazes tu aqui?
Quis tornar-te amável ser teu familiar
fabriquei projetos com teus cornos
lambi teu focinho e acariciei-te em vão

A tua marcha lenta enerva-me e satura-me
As constelações são mais rápidas nos céus
a terra gira com um ritmo mais verde que o teu passo
Lá fora os homens caminham realmente
Há tanta coisa que eu ignoro
e é tão irremediável este tempo perdido!
Ó boi da paciência, sê meu amigo!!

(do livro Viagem através de uma nebulosa, do poeta e escritor(??) português António Ramos Rosa.)

sexta-feira, 15 de junho de 2012

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Novella Matvêieva


















A ALMA DAS COISAS

Gosto das casas
onde as coisas não são propriedade,
onde as coisas
são mais leves do que barcas no ancoradouro.
Não gosto das coisas sem que haja o dom
de uma mágica relação com elas.
Não, não é em ti que reside,lareira, a tua força:
de lenha, tu te enches,
como uma boca cheia de palavras,
mas não hei de arder enquanto
o mediador entre nós não for o Fogo.
Hão de me dizer:
joga fora os sonhos,
desenha a realidade,
descreve tal como são
as botas, a pera, a ferradura…
Mas se a realidade é imagem aparente
o que eu procuro é alma
sob a realidade.
Repito sempre:
o sal não está no sal
e nem o prego está no prego.

Tradução: Lauro Machado Coelho
(Poesia Soviética, 2007, Algol Editora)

terça-feira, 12 de junho de 2012

Travesti



Reportagem publicada pela revista Época, retirada no sítio http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI4421-15228,00-POR+QUE+HOMENS+PROCURAM+TRAVESTIS.html, reproduzida aqui sem autorização do autor, Ivan Martins.
Mas a matéria é boa, ajuda a derrubar mitos e esclarece um pouco.

Por que homens procuram travestis?
Muitos parecem precisar de uma forma atenuada de sexo com outro homem. A ambiguidade dessa relação sugere muitas outras fantasias
Ivan Martins


CABEÇA ABERTA

Márcia, travesti de classe média paulistana. “Os homens que saem comigo são héteros que topam tudo”Mendes tem 37 anos, cabeça raspada e brinco na orelha direita. Pelos modos e pela aparência, o rapaz branco de família evangélica não se distingue de outros milhões de jovens paulistanos, exceto por uma particularidade importante: ele namora um travesti, Flávia. Os dois se conheceram há cinco anos no centro de São Paulo e, de lá para cá, constituem um casal. Na semana passada, sentado ao lado de Flávia na sala de um apartamento na Rua General Osório, Mendes explicava, em voz pausada, as bases da relação. “Nosso relacionamento é hétero”, afirma. Isso quer dizer que, no sexo, ele é a parte viril do casal, enquanto Flávia cumpre o papel de mulher. “Mas entre nós não existe só sexo. A gente tem amor e cuida um do outro.” Com cabelos negros e corpo esguio, Flávia ganha a vida se prostituindo nas ruas. Ele trabalha nas ruas como vendedor.

As palavras de Mendes revelam, sem explicar, um dos grandes mistérios da sexualidade moderna: a sedução exercida pelos travestis. Desde meados dos anos 70, quando despontaram nas esquinas das metrópoles brasileiras com saias minúsculas e seios exuberantes, essas criaturas híbridas conquistaram um espaço enorme no imaginário sexual do país. Todos os dias, milhares de homens se esgueiram por avenidas sombrias para comprar o prazer oferecido por seus corpos alterados. O risco envolvido nesse tipo de operação ficou claro há duas semanas, quando Ronaldo Nazário, o jogador de futebol mais famoso do mundo, transformou-se no protagonista de um escândalo que tinha como coadjuvantes três travestis do Rio de Janeiro. Ele foi com o grupo ao hotel Papillon e, durante a madrugada, desentendeu-se com um deles, Andréia Albertini. Acabaram todos na delegacia, de onde a história ganhou o mundo. A avalanche moral que desabou sobre Ronaldo a partir daí foi incapaz de responder à questão mais simples colocada pelo episódio: por que homens adultos e mesmo famosos arriscam segurança e reputação e vão atrás de travestis?

O antropólogo americano Don Kulick passou um ano vivendo com travestis em Salvador, sabe muito de seu cotidiano e mesmo de suas preferências íntimas. Mas não se arrisca a explicar quem são seus clientes. “Essa é uma grande incógnita. Embora acompanhasse os travestis todas as noites, não consegui distinguir um cliente típico”, diz. O livro de Kulick, professor da Universidade Nova York, sairá em português no fim deste mês, pela editora Fiocruz, com o título Travestis: Prostituição, Sexo, Gênero e Cultura no Brasil. Kulick conseguiu uma descrição razoavelmente rigorosa do que os fregueses exigem dos travestis. Durante um mês, pediu a cinco deles que registrassem o tipo de serviço prestado nas ruas. O resultado de 138 programas: em 52% dos casos os clientes queriam sodomizar, em 19% exigiam sexo oral, 18% queriam fazer aquilo que se costuma chamar de “troca-troca”, 9% pagaram para ser sodomizados e 2% para ser masturbados. “Não é insignificante que 27% dos homens nessa amostragem quisessem ser penetrados por travestis”, escreve s Kulick. “Mas esses homens não são maioria, como os travestis geralmente afirmam.”

‘‘Não é irrelevante que 27% dos homens da amostragem quisessem ser penetrados pelos travestis’’,DON KULICK, antropólogo americano
A confiar apenas no que dizem os travestis, o porcentual de seus clientes que se portam como homossexual passivo é alto. “Nove em cada dez homens querem ser penetrados”, diz Flávia, a namorada de Mendes. “Se o travesti não for bem-dotado e ativo, não ganha a vida na rua.” Exagero? Talvez. Assim como as prostitutas, os travestis têm uma relação antagônica com aqueles que pagam para usar seu corpo. Muitos não suportam exercer o papel viril que se exige deles na prostituição e o fazem com grande sofrimento, porque não encontram outra forma de ganhar a vida. Vingam-se dessa situação degradante com a mesma arma que a sociedade usa para humilhá-los: questionam a hombridade do freguês e o ridicularizam.

O psiquiatra Sérgio Almeida trabalha com travestis em São José do Rio Preto, no interior de São Paulo, e sua experiência corrobora em alguma medida a versão de Flávia. Cabe a Almeida a tarefa difícil de distinguir entre os travestis – definidos como homens que gostam de agir e sentir como mulher – e os transexuais, que se sentem mulheres aprisionadas em corpo masculino. Para estes, recomenda-se a cirurgia de troca de sexo. Para os travestis, ela equivale a uma mutilação e pode levar ao suicídio. Almeida gasta dois anos com cada paciente até decidir em que categoria ele se encaixa. “Desde 1997, fizemos 95 cirurgias e não tivemos nenhum problema”, afirma. O pós-operatório mostrou ao psiquiatra que ex-travestis são freqüentemente abandonados por seus parceiros quando perdem a anatomia masculina. E que os operados que insistem em continuar na prostituição perdem também a carteira de clientes. Algo de crucial desapareceu na cirurgia. “Não é verdade que os homens procuram travestis porque estes se parecem mulheres”, diz ele. “Eles querem o algo mais que as mulheres não têm.”


TRANGRESSÃO

Por que os homens arriscam sua honra e sua segurança nesse tipo de aventura sexual Os próprios envolvidos têm opiniões diferentes. Um leitor anônimo de epoca.com.br enviou depoimento no qual afirma, basicamente, que os travestis são a melhor opção sexoeconômica. Diz ele: “Já saí com vários travestis. O que me atraiu foi justamente o desejo físico pelos bumbuns e seios avantajados. Ficar com uma travesti para mim é conseguir a baixo preço uma mulher de porte e formas que eu jamais conseguiria pagar ou namorar”. Márcia, travesti paulista,repele qualquer tentativa de analisar os homens com quem sai voluntariamente. “Para mim, homens que saem com travestis são heterossexuais de cabeça aberta, que topam qualquer coisa”, afirma. Advogado, casado, pai de uma moça, diz que tem impulsos de vestir-se e agir como mulher desde criança, mas que isso nunca o impediu de ter relações normais com mulheres: “Quando saio com um homem, ele não importa. O que me interessa é reforçar minha identidade de mulher”.

O mistério em torno dos homens que procuram travestis é proporcional à ignorância que cerca os próprios travestis. Como grupo populacional, eles são escarçamente estudados: não se tem a menor idéia de quantos sejam, no mundo ou no Brasil. Os líderes das organizações de travestis estimam que haja 5 mil ou 6 mil deles no Rio de Janeiro e uma quantidade muito maior – fala-se em 30 mil – em São Paulo. Nenhuma ciência ampara essas estimativas. Sabe-se que há travestis de Porto Alegre a Manaus, inclusive em cidades pequenas. Tem-se a impressão, entre os que lidam com o assunto, que o Brasil é o líder mundial nessa categoria – e o principal exportador para os países europeus, sobretudo Itália e Espanha. “O Brasil tem a maior população mundial de travestis e o maior número de travestis per capita”, afirma Kulick. Trata-se de uma opinião bem informada, mas é apenas opinião. Líderes de organizações de travestis como Keila Simpson, presidente da Articulação Nacional de Travestis e Transexuais, querem que o censo inclua perguntas que permitam quantificar os diferentes grupos sexuais do país. “Como se pode dirigir políticas públicas a uma população de tamanho ignorado?”, diz.

A palavra-chave quando se trata de explicar a atração exercida pelos travestis parece ser ambigüidade. Eles são percebidos simultaneamente como homem e mulher, uma incongruência que mexe com as profundezas da psique humana. “O travesti mobiliza o desejo como mobiliza a repulsa”, afirma a psicanalista carioca Regina Navarro Lins. Outra psicanalista, Maria Rita Kehl, vê duas razões no fascínio pelos travestis. A primeira é que, por ser uma mulher com pênis, ele captura os restos das fantasias sexuais infantis. A outra está no fato de os travestis encarnarem a feminilidade de uma forma absoluta, que nenhuma mulher contemporânea aceitaria. “Só um travesti saberia ser tão feminino quanto quer a fantasia de alguns homens”, diz Maria Rita. “Se alguém sabe o que é ‘ser mulher de verdade’ (uma ficção masculina), é justamente o travesti.” Os próprios travestis são taxativos ao afirmar que seus fregueses procuram neles a diferença: a mulher com falo, a fantasia, o risco. “Transgressão é essencial. O proibido atrai”, afirma Marjorie, travesti com 20 anos de experiência nas ruas, que hoje trabalha na Secretaria de Assistência Social da Prefeitura do Rio de Janeiro. “As coisas que se dizem sobre os homens que saem com travestis são lendas machistas.”

Paira sobre essa discussão uma palavra que os psicanalistas detestam: patologia. Sim, as pessoas têm o direito inalienável de manter relações sexuais com quem quiserem, desde que haja consentimento mútuo. Posto isso, cabe a pergunta: está bem de cabeça um homem casado (como parece ser a maior parte dos clientes dos travestis) que abre a porta de seu carro na porta do Jockey Club, em São Paulo, e paga R$ 40 por uma hora de sexo com um homem que parece ser mulher? Os especialistas não têm uma resposta unânime a isso.

“Só um travesti saberia ser tão feminino quanto quer a fantasia de alguns homens”, diz uma psicanalista.

Liberais dizem que, bolas, desejo é desejo, e não se pode explicar ou reprimir. Há que aceitar. “Entendo que os homens que só se realizam sexualmente com travestis possam estar mal resolvidos em sua orientação sexual”, diz Maria Rita Kehl. “Mas considerar que todos os que gostam de travestis são homossexuais acovardados é uma redução preconceituosa.” Na outra ponta, fala-se em sofrimento e confusão por trás dessa forma específica de prazer. “Para alguns homens é patológico”, afirma o psicanalista Oswaldo Rodrigues, do Instituto Paulista de Sexualidade. “Muitos fazem isso num impulso de autodestruição.”

Há os incapazes de lidar com seu próprio desejo por outros homens. Há os que buscam cumprir seu “papel social” no corpo feminilizado dos travestis. Há de tudo, e nem tudo é a festa do desejo que a modernidade implicitamente recomenda. Onde está o limite? Na dor. De acordo com o psiquiatra Ronaldo Pamplona da Costa, com mais de 30 anos de experiência terapêutica, muitos homens que saem com travestis o procuram em estado de sofrimento. Eis o que diz a respeito a psiquiatra Carmita Helena Abdo, que coordena o Projeto de Sexualidade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo: “Se as pessoas fazem sexo responsável, não estão sofrendo e não me procuram, não quero normatizar a vida de ninguém”.

Adendo: A sabedoria do comentário da Dra. Carmita Helena Abdo é luminosa! Se não é um problema, não se o transforme em um!

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Gastão volta, e bravo!!

Gastão andou sumido...Achava que o mundo não merecia sua preocupação,e, como diz uma querida amiga, anda preocupado com as coisas do coração. "Preocupado" por que Gastão só se preocupa, não consegue pensar em nada sem antever consequências diluvianas para tudo o que pensou.

Ah! O Judiciário Brasileiro!!Mesmo nas suas pequenas mesquinharias, como as briguinhas dos Ministros, o Supremo demonstra ter perdido o tino e a noção de sua importância na representação da transferência de poder  pessoa/Estado. Ninguém quer uma Dona Maricota para julgar as coisas que são importantes no desenrolar da vida de cada um. Dona Candinha também não preenche a necessidade de seriedade que todos precisamos na tomada de decisões diárias, afinal, as pequenas coisas do dia a dia (hífen?não hífen? Lá vamos nós!!) somente são pequenas por que existem as grandes questões, a serem resolvidas por "eles". E a voz das ruas, embora capaz de provocar sérias movimentações, não tem força suficiente para alterar um status quo que se encaminha a passos rápidos para a degeneração. O que fazer? Bíle neles? Ainda não, com certeza vão aprontar alguma coisa que se sobreporá (ah!a língua portuguêsa!!em seus meandros habitam monstros horríveis, embora cheios de boas intenções!!)a essa Mesa de Bar em que estão transformando o Plenário do Supremo. Usei maiúsculas, vejam só!!Devo estar com algum problema...

Sérgio Cabral? Cachoeira??!! Tudo cascata, com perdão do trocadilho pobre. Quem acompanhou a CPI do propinoduto e os depoimentos dos envolvidos e está ciente, de ouvir falar, do esquemão do ICMS no Rio, não é surpreendido por nada do que é dito e também pelo que não é dito. Terminará como sempre: o porteiro deverá dar um depoimento bomba, implicará o gerente e a secretária, a Polícia Federal, mais uma vez, fará papel de boba e nós acharemos que o país está melhorando.

Ah! As obras para a Copa não vão ficar prontas??!!Então, que sejam retiradas do compromisso firmado com a FIFA. Pronto!Resolvido!! Só não sei a razão para não fazerem um decreto proibindo a falta de vergonha e o descaramento na Presidência e órgãos da Administração direta. Já que tudo pode ser resolvido assim, resolvamos!!

Mas a vomitada da semana, do Gastão, vai mesmo é para o carioca, este deseducado, incivilizado, impaciente, zangado,  sem noção mínima de urbanidade. Reclamar de tudo e ter direito a tudo não faz de ninguém um cidadão, Ô cariocada!!! Não dá para colocar um gari atrás de cada um, não dá para reclamar do trânsito enquanto se está parado em cima da faixa de pedestre, não dá para reclamar do preços das coisas no mercado enquanto se fura a fila de idosos ou de volumes, não dá para reclamar de camelô enquanto se pede para alguém "dar um jeitinho" no seu problema, não adianta ser voluntário no INCA enquanto se deixa o cachorro viver em uma área cheia de cocô, não adianta reclamar do preço nos restaurantes e esquecer de ajudar a quem precisa. Muita gente está tão sem nada que algum é uma enormidade. Pense nisso, ô carioca!!

Como disse aquele chefe índio, tá tudo ligado!!!!E não é na tomada!!!

sábado, 9 de junho de 2012

Problema de Visão


Você tem tido tempo para olhar quem você ama? Eu amo esses dois aí..."sem vocês meu mundo não seria completo"...Ah! Eu também amava a Cássia Eller.

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Como é feito Encadernação de Livros

Como é feito Encadernação de Livros

Este post era destinado ao Cavezan, mas mandaram para cá! O erro de Português é impossível de corrigir, pelo menos até onde permitem meus parcos conhecimentos de informática. Mas, apesar de tudo, não deixa de ser interessante.

Roberto Piva

Um poeta anarquista, um Allen Ginsberg tupiniquim, infelizmente pouco reconhecido e  já foi difícil de encontrar. Hoje, temos as re-edições da  Globo, incluindo aí o clássico Paranóia, de 1963, com as ilustrações de Wesley Duke Lee (sorry, eu tenho um exemplar!!!).Só para alegrar seus olhos:

Praça da República dos meus sonhos

(...)
os veterinários passam lentos lendo Dom Casmurro
há jovens pederastas embebidos em lilás
e putas com a noite passeando em torno de suas unhas
(...)

* * *

O jardim das delícias


(...)

relâmpagos do mesmo líquen magnético de tua boca
de quinze anos
quando não vais à escola para assistires Flash Gordon
& ler Otto Rank nas esquinas
o mundo continua sendo um breve colapso logo que as
pálpebras baixem
& meu amor por ti uma profanação consciente de
eternas estrelas de rapina

* * *

abandonar tudo. conhecer praias. amores novos.
poesia em cascatas floridas com aranhas
azuladas nas samambaias.
todo trabalhador é escravo. toda autoridade
é cômica. fazer da anarquia um
método & modo de vida. estradas.
bocas perfumadas. cervejas tomadas
nos acampamentos. Sonhar Alto.

* * *

eu sou o cavalo de Exu
ebó
do meu coração
despachado
na encruzilhada dos cometas

*****
Paranóia (1963)

Eu vi uma linda cidade cujo nome esqueci
onde anjos surdos percorrem as madrugadas tingindo seus olhos com
lágrimas invulneráveis
onde crianças católicas oferecem limões para pequenos paquidermes
que saem escondidos das tocas
onde adolescentes maravilhosos fecham seus cérebros para os telhados
estéreis e incendeiam internatos
onde manifestos niilistas distribuindo pensamentos furiosos puxam
a descarga sobre o mundo
onde um anjo de fogo ilumina os cemitérios em festa e a noite caminha
no seu hálito
onde o sono de verão me tomou por louco e decapitei o Outono de sua
última janela
onde o nosso desprezo fez nascer uma lua inesperada no horizonte
branco
onde um espaço de mãos vermelhas ilumina aquela fotografia de peixe
escurecendo a página
onde borboletas de zinco devoram as góticas hemorróidas das
beatas
onde os mortos se fixam na noite e uivam por um punhado de fracas
penas
onde a cabeça é uma bola digerindo os aquários desordenados da
imaginação

Obs.:Não tenho autorização para reproduzir os poemas dele, mas mesmo assim o faço.

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Allen Ginsberg

Parece que o poema S&M provocou alguns calafrios...então, como diz a Valéria, vou postar uma coisa "bonitinha"dele.                                                           

                                              Canção

O peso do mundo
é o amor.
Sob o fardo
da solidão,
sob o fardo
da insatisfação
o peso
o peso que carregamos
é o amor.

Quem poderia negá-lo
Em sonhos nos toca
o corpo,
em pensamentos
constrói
um milagre,
na imaginação
aflige-se
até tornar-se
humano -

sai para fora do coração
ardendo de pureza -
pois o fardo da vida
é o amor.

mas nós carregamos o peso
cansados
e assim temos que descansar
nos braços do amor
finalmente
temos que descansar nos braços
do amor.

Nenhum descanso
sem amor,
nenhum sonho
sem sonhos
de amor-
quer esteja eu louco ou frio,
obcecado por anjos
ou por máquinas,
o último desejo
é o amor
-não pode ser amargo
não pode ser negado
não pode ser contido quando negado:

o peso é demasiado
- deve dar-se
sem nada de volta
assim como o pensamento
é dado
na solidão
em toda a excelência
do seu excesso.

Os corpos quentes
brilham juntos
na escuridão,
a mão se move
para o centro
da carne,
a pela treme
na felicidade
e a alma sobe
feliz até o olho -

sim, sim
é isso que
eu queria,
eu sempre quis,
eu sempre quis
voltar ao corpo
em que nasci.

A tradução, chiquérrrmica, é de Cláudio Willer, de 1984, quando a LPM procurava se destacar da mesmice editorial.

Dead Can Dance

A maravilhosa Lisa Gerard, que depois que o grupo acabou, gravou alguns CDs muito lindos...



O nome da música é Desert Song.

domingo, 3 de junho de 2012

Ignorância e Apatia



Ah! Um mundo novo, nos prometeram!!Informações circulando à velocidade da luz, cai nas Filipinas, ouve-se o barulho no mesmo instante em Marabá....mudem os nomes, tudo faz sentido. A questão é que nada faz sentido.

As mudanças prometidas não vieram, "nossos ídolos ainda são os mesmos e as aparências não enganam, não!!". Continuamos aqui, carregados com um volume absurdo e absoluto de informações, sem saber muito bem o que fazer com elas. Há poesia no éter, imagens servem ao Benedito e ao Clarence sem qualquer tipo de controle, a sensação de déja vu é praticamente permanente, a novidade é peça de um museu caindo de velho...Nossos profetas eram novos e se foram antes de desmoronarem junto com o mundo que os desacreditou, reafirmando suas palavras a todo instante.

Ser humano era e sempre foi comunicar-se. E esse atual excesso de informações não nos tornou mais humanos, nem mais ricos interiormente. Porque carregados de dados e informações, imaginamo-nos ricos, prontos para o mundo, plenos de uma sabença que se revela inútil, porém divertida... O que é verdadeiramente importante fica lá, embaixo de um volume indecifrável de informações e dados.

Mas é uma questão de livre-arbítrio, é só decidir o que é importante e o que é indispensável! O resto circula... Caso fosse simples assim, tudo se resumiria em uma nota de rodapé. Mas não é!! O núcleo de nosso tormento, a semente que insiste em permanecer estéril, hídrida, está lá, no íntimo de cada um. Todos nós sabemos o que é importante: sobreviver, dar e receber amor, poder exercer nossa criatividade diante de tantos estímulos já prontos.

 Pensar conhecermos as coisas e pessoas, permanecermos  tranquilos dentro das muralhas que vamos erguendo ao longo da vida. E tudo que permanece fora dessas muralhas, mesmo que prazeroso ou doloroso, a cada um é dada sua experiência, tudo permanece indiferente, irrelevante...O homo comunicans está entregue aos seus dois maiores inimigos: o excesso de informações e a apatia.

A solução, para quem a procura, pode ser essa: interiorizar-se, olhar dentro de si próprio e discernir até onde é doentia esta avidez pela novidade, pela informação nova. Resolvida essa questão, primordial, exteriorizar-se para o outro, deixá-lo perceber de sua (dele)importância em sua vida, e o que é importante para o outro pode vir a ser importante para si. Amar aos outros como a si mesmo pode ser traduzido como "Conhece-te a ti mesmo!!". Pode ser uma nova informação, uma feliz novidade para muita gente!!



sexta-feira, 1 de junho de 2012

Studium

Não é porque é dirigida pelo Fernando de Tacca, um príncipe, mas a revista studium é fundamental para quem pensa design, imagem  e fotografia. Divirtam-se, mas não se percam nesses labirintos charmosíssimos que o Fernando preparou para esconder seus Minos...

http://www.studium.iar.unicamp.br/