terça-feira, 24 de setembro de 2013

Poupar de amor, poupar de amar, perdoa-me por te ferir...


Para Vos Poupar ao Meu Amor

Sentada à mesa do jantar, troco com a família considerações de recém-licenciada. Constato, pela primeira vez e com alguma violência, que o mundo contemporâneo não foi feito para mim. Ou que eu não fui feita para o mundo contemporâneo. Sinto - fulminantemente e obscuramente e dolorosamente - que a matéria de que sou feita não poderá resistir a um só dos maravilhosos planos que a civilização humana tem preparados para mim desde há séculos: ser mulher, mãe, trabalhadora, cidadã. Crente, protestante. Ser amiga, ser amante. Sou uma peça do puzzle que não encaixa, um produto industrial com defeito de fabrico. Tenho por dentro um intruso, um inimigo invencível. Estou à mercê de um predador implacável. Compreendam: eu não posso esperar pelo Natal para que possa dizer que vos estimo. Eu não posso esperar pelo fim das coisas para que possa dizer que vos desejo bem. Do que eu preciso é de um mundo onde possa citar Rilke sem correr o risco de ser internada. Onde possa viver livremente o meu romantismo sôfrego e vagamente idiota. Um mundo onde possa aparecer - sem livro para devolver, sem DVD para pedir emprestado - e dizer «Tudo, excepto tu, é rotina peganhenta»! 
Ouvir dizer «amo-te» era fácil, hoje já é mais complicado. Requer muito treino, não estamos preparados. Fomos educados para sermos acima de tudo eficazes. Nada nos foi dito na aula de descer abismos. Nada vem escrito nos livros que lemos. Tudo nos abala, nos confunde. Nos funde por vezes com o que, depois vemos, não é digno do nosso amor. 



Ah, o amor. O amor faz-se se houver tempo. O amor faz-se aos bocadinhos e só se convier. O amor faz-se na pausa para o café. O amor é uma aberração. O amor mete medo. Chega-te para lá com esse «adoro-te»! Não me venhas com esse «gosto de ti»! Cai-nos a PIDE do amor em cima, és apanhado e vais dentro. O amor quer-se preso pela trela. O amor quer-se de castigo no canto da sala. Pouca conversa, pouco barulho. O amor custa. Perde-se tempo e dinheiro. O amor está fora de moda. Não condiz com as batas brancas da biologia nem com os botões coloridos da tecnologia nem com a cor do papel dos contratos pré-nupciais. O amor é para meninos, ser-se crescido é outra coisa. O amor foi-nos confiscado. 
Não contem comigo. Eu não tenho jeito nenhum para ser a pessoa que todos esperam. Não tenho competência para ficar a ver o amor passar sem correr atrás. Compreendam: o amor é a minha campainha de Pavlov. 
Estímulo-resposta, como me foi explicado na escola de fazer profissionais. 
Eu não tenho jeito para telefonemas nem para passeios em centros comerciais. 
Não contem comigo para ser cão que ladra mas não morde. Não contem comigo para não dizer o que não é suposto. Para cancelar beijos, inventar pretextos, sufocar euforias, adiar alegrias. Para vos escutar em silêncio. 
Para vos poupar ao meu amor, não contem comigo. Compreendam: eu não me posso comprometer. 

Susana Cristina Marques Santos, in 'Textos de Amor – Museu Nacional da Imprensa'

Evidentemente, há razões para isto, eu não me comprometo, eu não peço moderação, hoje só peço desculpas...mas não posso me comprometer em poupar o meu amor.


domingo, 22 de setembro de 2013

O grande erro é estar certo...

Foto minha, na ArtRio 2013. Esqueci o autor...

Há tempos sem postar, né? Queria evitar o inevitável lugar comum, passar ao largo da decepção fundamentada em preceitos legais, da escarificação da justiça brasileira (sempre com minúsculas, a partir de hoje).

 A discussão de que a vida (pública) é um teatro, ou poderia ser tomada como uma peça teatral é antiga e tem argumentos fortes para sua afirmação e para a negação também. Richard Sennett, no seminal livro The Fall of Public Man", discute um ensaio de Fielding, chamado "A Comparison Between the World and the Stage", que começa:



"O mundo tem sido frequentemente comparado a um teatro...este pensamento tem sido usado por tanto tempo, e se tornado tão geral, que algumas palavras próprias do teatro, e que são, a princípio, metaforicamente aplicadas ao mundo, agora são usadas indiscriminadamente e literalmente pelos dois (mundos): assim, palco e cena, devido ao uso, tornaram-se familiares para nós, tanto quando nós falamos da vida em geral, quanto nos confinamos à performance dramática."


e por aí vai, até a afirmação de que "a single bad act no more constitutes a villain in life than a  single bad part on the stage...the analogy becomes a literal truth. The character of acts and the character of actors are separate, so that a man of the world "can censure an imperfection, or even a vice, without rage against the guilty party".



Estão percebendo onde quero chegar?  Não há como definir as pessoas vivendo numa sociedade como a nossa, e a ênfase, então, deve ser na análise do que as pessoas praticam e fazem em relação às outras. Pratica-se o mal e fere-se alguém? A grande questão passa a ser, para esta pessoa, a mudança de seu papel social. E qual seria a razão para não fazê-lo, já que não há papel fixo na sociedade determinado pela necessidade ou pelo conhecimento que os outros têm de seu passado. (aqui, traduzi, misturei, inclui, um turbilhão....)

Onde chegarão nossos homens públicos, com a prática dos atos lesa-sociedade que têm nos atirado, como uma carga nos ombros de escravos condenados a uma eterna caravana através de um deserto de boa vontade, sem um oásis à vista? A certeza de que a analise de seus contemporâneos poupará o caráter particular os deixa à vontade para a prática de todo o mal.



A transferência de poder, tão discutida por Hannah Arendt, tem se mostrado equivocada e mal dirigida. É preciso que tenhamos consciência disto já para que nosso futuro vá além de um abismo que nos aguarda logo ali. Não houve civilização que resistisse a isto, a esta falta de perspectiva e futuro.

supremo tribunal federal, tão "legal" e "cônscio dos diplomas legais, igualitários e soberanos", você tem ideia do mal que fez a esse país? O grande erro, eventualmente, é estar certo.

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

New Hope


Nossos amigos nos levaram para passear em New Hope, uma pequenina cidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos.


Nós, no famigerado restaurante...

Muito interessante, parece uma Umbu das Artes com arte e educação... e o lugar é absolutamente lindo.


Tem um teatro imenso, restaurantes a perder a conta, muitas sorveterias e, em um dia de verão, fica lotadíssima. Como fica a apenas uma hora, uma hora e meia de NYC, recomendo o passeio.

Por sinal, em New Hope aconteceu um fato inédito, pelo menos para mim, que viajo há tantos anos e nunca tinha presenciado um garçom, isso mesmo, um garçom de restaurante ser absolutamente agressivo, mal educado, desatento e respondão. A história é um pouco longa, mas ele foi punido na forma america: US$ 0,47 (quarenta e sete centavos de dólar americano), de gorjeta. É o que americano entende: punição no bolso, ficar discutindo não iria acrescentar nada para ele nem para nós. O pior é que não anotei o nome do restaurante, para NÃO recomendá-lo aqui.


Em compensação, a French Bakery é muito boa, com doces e pães feitos por uma família francesa. É um pouco difícil de achar, mas andando pela rua principal, dá-se de cara com esta placa. Não tem erro, pode escolher qualquer um dos pães ou dos doces.

Muitas fotos desapareceram, a do cartaz da psychic, ou fortune teller, que cobrava por parte do corpo que ela lia: uma palma, duas palmas, futuro para um mês, dois ou seis meses...e escalava em valores e estava lendo a mão (ou as mãos, ou o cotovelo) de alguém quando tirei a foto...que coisa.