segunda-feira, 9 de junho de 2014

Observando as coisas...Parte II

Como disse a Valéria, do blog Macaquices e outras coisas - além de escrever superbem, ela fotografa melhor ainda!- cadê os outros tópicos? Eu havia numerado dois, dos seis que queria apresentar, mas, honestamente, desanimei.n Fiquei matutando a conveniência e oportunidade de escrever algo que mostra mais de mim do que daquilo sobre o que  quero escrever. Minha paciência, também, já não é o que er(r)a....mas ela também é um dos tópicos pendentes.

3. A Caridade Gorda

Já falei nela aqui, mas de uma vez. Sandor Marais, em As horas, fala sobre a caridade que não requer esforço, a caridade "gorda dos excessos", fácil, suarenta...e ela anda muito em moda na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro.

"...
Que ando eu a querer de mim ou de tudo neste mundo? 
"Se eu não tivesse a caridade." 
E a soberana luz manda, e do alto dos séculos, 
A grande mensagem com que a alma é livre... 
"Se eu não tivesse a caridade..." 
Meu Deus, e eu que não tenho a caridade..."


Fernando Pessoa, né? e só poderia ser ele.

As pessoas estão se santificando, se beatificando. Amam os animais, as criancinhas com câncer ou doentinhas, as matas ciliares (é assim que se escreve, viu?), os cães abandonados, mas ama-se, principalmente, o próprio bolso, já que as caridades em exposição limitam-se sempre ao menor esforço, ao menor desfalque no orçamento mensal ou semanal...não pode dar trabalho, nem requerer algum sacrifício. E, pronto, santifica-se a criatura, passa a agir como um ser superior ao comum dos mortais, não se lembrando que 

A Prisão do Orgulho

Choro, metido na masmorra 
do meu nome. 
Dia após dia, levanto, sem descanso, 
este muro à minha volta; 
e à medida que se ergue no céu, 
esconde-se em negra sombra 
o meu ser verdadeiro. 

Este belo muro 
é o meu orgulho, 
que eu retoco com cal e areia 
para evitar a mais leve fenda. 

E com este cuidado todo, 
perco de vista 
o meu ser verdadeiro. 

Rabindranath Tagore, in "O Coração da Primavera" 

Tradução de Manuel Simões

Isto sem falar nas redes sociais, este planeta espelho do planeta Terra, onde tudo é lindo, as pessoas se permitem ser mal educadas ao vivo e em cores, a paciência é praticamente zero e as reclamações, sobre tudo e todos, abundam!

Salvam um cachorrinho e correm para postar antes mesmo que o pobrezito faça seu primeiro cocozinho consistente. Gente, vendam este celular e doem o dinheiro para a Suípa (antes que falem, eu contribuo mensalmente há anos!).

Em Fernando de Noronha pude ter contato com várias pessoas deste tipo, que se sentem superiores à rafaméia por terem um trabalhinho em uma ONG, por colherem cascas de ovos de tartaruga e escovarem os dentes dos tubarões! Voluntários também, parecem que conseguiram um brevê para a santidade!

Mas, enfim, este é o planeta em que vivemos, o país em que nascemos e a cidade que escolhemos para ficar! Atura-se, satura-se, e, enquanto isso, escrevemos nossas bobagenzinhas que nos ajudam a suportar este calvário diário, este Gólgota de infelicidades e descaminhos que não conduzem a santidade alguma.

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