terça-feira, 27 de novembro de 2012

Eugénio de Andrade



Poetas portugueses, eles têm esses nomes acentuados em lugares estranhos para nós, brasileiros... e insistem em nos manter distantes, nosso mercado editorial, por alguma razão, não nos descortina as maravilhas que não exigem dicionários nem interpretações, apenas a possibilidade do sentimento atingido. Nessas horas, agradeço muito às antologias de poesia portuguesa, capaz de nos desvendar esses mistérios tão à nossa disposição e tão ignorados.
                

Cansado de ser homem durante o dia inteiro
chego à noite com os olhos rasos de água.

Posso então deitar-me ao pé do teu retrato,
entrar dentro de ti como um bosque.

É a hora de fazer milagres:
posso ressuscitar os mortos e trazê-los
a este quarto branco e despovoado,
onde entro sempre pela primeira vez,
para falarmos das grandes searas de trigo
afogadas na luz do amanhecer.

Posso prometer uma viagem ao paraíso
a quem se estender ao pé de mim,
ou deixar uma lágrima nos meus olhos
ser toda a nostalgia das areias.

(em As Palavras Interditas)

e também:


Sobre a Palavra


Entre a folha branca e o gume do olhar
a boca envelhece

Sobre a palavra
a noite aproxima-se da chama

Assim se morre dizias tu
Assim se morre dizia o vento acariciando-te a cintura

Na porosa fronteira do silêncio
a mão ilumina a terra inacabada
Interminavelmente

(em Véspera da Água)


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