terça-feira, 3 de junho de 2008

Florbela II

Ensaio sobre o Poema Eu, de autoria de Maya Ogwaru, publicado no sítio prahoje.com

Eu

Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada… a dolorida…

Sombra de névoa ténue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!…

Sou aquela que passa e ninguém vê…
Sou a que chamam triste sem o ser…
Sou a que chora sem saber porquê…

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver
E que nunca na vida me encontrou!


Florbela Espanca - Livro de Mágoas

Este soneto não é o primeiro do seu livro ‘Livro de Mágoas’ embora seja uma excelente autobiografia. Nela está contida a dor, a incompreensão que Florbela sofria e não percebia.

Florbela apresenta-se como uma mulher desnorteada, sem rumo na vida, desejando a evasão e sendo ligada com a irrealidade. “Crucificada” e “dolorida” são os adjectivos escolhidos para se caracterizar psicologicamente. Crucificada por não ser compreendida pelos maridos e não só; “dolorida” pela tristeza que trazia dentro de si.

A negridão débil e desfeita que o destino mais forte (triste e amargo) irá conduzi-la á morte. Note aqui um sentimento de predestinação e o sentimento que a culpa da sua morte é do destino. Termina a quadra com uma caracterização sua global “Alma de luto” (morte / sombra) “sempre incompreendida” (Florbela compreendia muito bem que nem toda a gente a aceitava e a entendia e foi esse factor que a fez desenvolver os seus poemas)

No primeiro terceto destaca a falta de atenção, a descriminação, o estereótipo que sofria por toda a gente pensar que estava sempre triste, acabando por confessar não saber o porquê de muitas vezes chorar. Florbela muitas vezes nos seus poemas confessa que não se sabe definir porque ainda não se encontrou, provavelmente a sua tristeza sistemática muitas vezes tinha um significado que ela própria nem sabia.

A predestinação do amor, do príncipe que era suposto vê-la e que nunca a encontrou. Talvez o melhor verso ou terceto que resuma a vida amorosa de Florbela Espanca. Uma vida cheia de amores, sem que nenhum fosse o certo.

Estudo sobre o poema feito por Maya Ogwaru

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