quinta-feira, 6 de maio de 2010

Nina Rizzi

5 poemas e uma linha reta

variação de intermezzo: impressões da aurora


pintar meu corpoema

azul de laranja

então quem sabe

amanheser.



architextura



se faz favor, da próxima

quero mais que ternura:



me inventa em iminência.


outra variação


em causa de te sonhar

minha noite se fez dia

e me calcei de nuvens.



outra variação, outra


em te sonhar fiquei tão santa

que agora pra me comer

só de joelhos.



ripristino, o il suo lavoro


não, menina,

eu não vou fazer chover.



as tintas estão estiradas

e meu corpo branco esparramado:

ele vai me pintar.



(camponesa, cheiro, estrelas, girassóis?

— como ele quiser.)



sanguidolente


tenho dois homens ao meu lado. um me disputa com lembranças d'uma época em que só havia por comida xapati com açafrão e nossas ânsias; promessas d'um futuro.



o outro me vem com canções, essa sua carne que me quer poemas pra dentes.



há ainda um terceiro, o que me pega e tem, essa chuva. tardia chuva-súplica que não veio em dia de são josé. a chuva que me traz saudades de tudo que não vivi, símbolo desse homem que não está e me é. chuva-choro de mim. chuva-você que me cai, dono de todos os meus ais.



os dois primeiros me cospem, me rasgam. vão-me embora. fica o homem que me dói e gargalha.



mas não me restam autopiedades. é bom também doer. as cólicas hemorrágicas e as pedras na vesícula; o pedaço de ostra que me ficou por indolência no dedão do pé esquerdo; ter uma dezena de filhos de cócoras; não tomar drogas e ter os piores pesadelos.



dessa vida suicida, tudo: a morte lenta e dorida, a morte boa overdose de gozo. E os poemas impossíveis, que até chão seco dá semente.

Retirado do sítio: http://www.escritorassuicidas.com.br/edicao39_4.htm#ninarizzi39

Um comentário:

Comente o que acha que deve, mas use termos gentis, mesmo que desaforados...