domingo, 21 de fevereiro de 2010

Mário Faustino

A Editora Max Limonad fechou as portas, uma pena, já que lançou alguns dos melhores livros de poesia da vida artístico-cultural brasileira. Por pura sorte, encontrei a edição da Poesia Completa-Poesia Traduzida, de Mário Faustino, em uma banca do Centro da Cidade! Já postei alguma coisa dele, mas há muito ainda

Na p. 161 encontra-se

Mito

Os cães do sono ladram
Mas dorme a caravana de meu ser;
Ser em forma de pássaro,
sonora envergadura
ruflando asas de ferro sobre o fim
dos êxtases do espaço,
cantando um canto de aço nos pomares
onde o tempo não treme,
onde frutos mecânicos
rolam sobre sepulcros sem cadáver:
E sonho outros planaltos
por mim sobrevoados na procela;
e sonho outras legendas
em mim argamassadas pelo vento,
trabalhadas em mim por mãos sem tato;
e sonho o que foi parco
mas meu e por que raro foi perdido;
e sonho o que foi vasto
mas de alheio me pesa sobre os ombros,
globo de ásperos polos,
continentes do medo
e mares onde o sangue é trilha e nódoa;
deitados no vitral
da noite intensa, exata,
assim um Fazedor empunha o cetro
ornado de serpentes;
assim refaz o que foi feito à sua
augusta semelhança
contrafacção de um gesto mais difícil
sonâmbulo e remoto - contundente;
e enquanto as nuvens quedam
de incenso carregadas, de semente,
levanto-me e estrangulo
o ato de nascer que me divide
em morna derrisão
disforme difidência de um presságio;
O Fazedor anula
o inferno que o refina
e alçando-se ao poente mais seguro
mergulha na verdade
acesa que o derrota e reduz ao
dormente ser de vidro e cor que sonha;

Os cães do sono calam
e cai da caravana um corpo alado
e o verbo ruge em plena
madrugada cruel de um albatroz
zombado pelo sol -

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